sexta-feira, 12 de março de 2010

Serra ‘inaugura’ maquete de ponte e vira piada nacional

Uma ponte com arquitetura moderna e por avantajado, daquelas de se tornar cartão postal quando, à noite, estiver toda iluminada. Uma referência mundial em arquitetura e engenharia no valor acima dos R$ 700 milhões. A construção, além de mudar a silhueta de uma cidade, também impacta diretamente na vida de quem mora aos seus arredores, afinal, ela liga a cidade de Santos ao Guarujá onde, hoje, este trajeto só pode ser feito por meio de balsa.
Enfim, uma perfeição, exceto por um detalhe: a ponte simplesmente não existe. Ela não passa de um sonho do governador de São Paulo, José Serra, que na última semana fez a sua “inauguração”. Muito mais aceitável seria, portanto, a inauguração da pedra fundamental, o chamado “início das obras”, através da assinatura da ordem de serviço para a edificação do projeto. Mas no caso em questão nem sequer existe licitação realizada para saber quem fará ou quando será iniciada a obra. A inauguração foi, efetiva e delirantemente, uma invenção do governo Serra.
O factóide da engenharia do governo de São Paulo mostra bem mais do que uma situação inusitada ou mesmo um afã para mostrar à população a intenção de realizar no Estado. Ao fazer um evento e mostrar uma ponte de mentirinha, de brinquedo, o governador tucano busca espaço político na mídia, tentando evidenciar a sua postura empreendedora. Quer mostrar ao Brasil o que está fazendo em São Paulo, como se dissesse “é isto que pretendo fazer ao país”. A obra em questão, usada para externar sua competência e arrojo administrativo, somente será inaugurada, se tudo correr bem, no próximo governo de São Paulo.

Repercussão
Imediatamente ao evento, já nas primeiras informações sobre a agenda do governador, a reação por parte da imprensa e pela crônica política nacional foi da incredulidade à piada. Alguns, céticos, questionaram sobre o início das obras ou mesmo sobre o planejamento, já amarrado a algum cronograma, para a execução do projeto. Mas logo depois este grupo se juntou àquele que de cara tinha percebido a manobra para ganhar holofotes e tudo virou motivo para troça. O evento político de José Serra virou fonte de humor.
Um dos principais jornalistas políticos do Brasil, Josias de Souza da Folha de S. Paulo, não resistiu. Especialista em bastidores, Souza bateu o martelo: Serra só pode ser candidato, uma vez que só um candidato seria “capaz de render-se assim ao burlesco”.
“O governador “inaugurou”, veja você, a maquete de uma ponte. E nem ficou vermelho. Uma tenda protegeu-o do Sol. Não, você não leu errado. É isso mesmo. Serra visitou o local onde será erigida uma obra que ainda nem foi licitada”, escreveu Josias de Souza em seu blog, um dos mais acessados do Brasil.
E prosseguiu: “Flertando com o ridículo, Serra discorreu sobre a obra que, depois de licitada, consumirá 30 meses e R$ 700 milhões da próxima gestão: ‘Com esta ponte (?!?!?!) nós vamos quebrar um gargalo que é muito importante aqui na região da Baixada Santista...’”. Resumindo: Serra alimentou o cenário com humor que nem mesmo os sites especializados do ramo conseguiram fazer.



 Estratégia
A posição de José Serra, pressionado por membros do PSDB a assumir rapidamente sua candidatura à Presidência, é uma só: rivalizar com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef. Dilma já foi escolhida pelo PT como pré-candidata à sucessão de Lula e tem, naturalmente, os holofotes garantidos. Testando sua capacidade de abiscoitar atenção, o governador paulista promoveu este “evento”, que também serviria para sondar a sua popularidade.
O momento que Serra atravessa não é dos mais confortáveis. Por um lado, há a serena caminhada para a reeleição em São Paulo, no entanto o tucano sofre com a enorme pressão exercida por grandes nomes de dentro de seu partido que o querem arriscando o certo pelo duvidoso: a disputa pelo Planalto. E em nome disto, e da demora em aceitar oficialmente o desafio, o governador paulista vem recebendo recados velados ou escancarados de aliados. Em meio a este temporal de opiniões e apertos, Serra decidiu buscar atenção e holofotes na imprensa nacional. Deu no que deu.


“Tem gente inaugurando até
maquete”, cutuca Lula em São Paulo

Enquanto isto, na também terra da garoa, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, acompanhado da ministra Dilma Roussef, realizou uma inauguração. Mas, desta vez, de algo, por assim dizer, mais sólido: uma usina termelétrica em Cubatão. Durante seu discurso também não resistiu e, a exemplo da imprensa nacional, também fez uma referência ao inusitado ato tucano.
"Tem gente inaugurando até maquete e nós queremos mostrar como é que as coisas acontecem neste país", afirmou o presidente em seu discurso. Pouco antes, ele citou dados de criação de empregos em seu governo e disse que repetiria os números porque, segundo ele, é preciso fazer isso em ano de eleições.
"Eu, quando comecei minha vida política, dizia que o político mentiroso fala assim: Eu mato a cobra e mostro o pau. Ora, o fato de você mostrar o pau não significa que você matou a cobra. Então, nós adotávamos o discurso de que um político verdadeiro mata a cobra e mostra a cobra morta", disse o presidente Lula.


Apagão
Lula e a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, pré-candidata do PT ao Palácio do Planalto, lembraram, em seus discursos, o apagão ocorrido no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Segundo Dilma, a obra inaugurada na última quarta-feira é parte de um objetivo para que o país "possa crescer sem ter gargalos como aqueles entre 2001 e 2002, quando o Brasil não tinha como abrir nem fábricas e nem shoppings (...) durante muitos anos o Brasil parou de investir, de construir. Quando você para de fazer, você desaprende", disse a ministra.
Ela afirmou ainda que o governo Lula "tornou a colocar o Brasil nos eixos" e que o país "não vai mais voltar a ser um país estagnado, sem emprego". Em outro trecho do discurso, o presidente disse que a inauguração da termelétrica era uma mensagem para o mundo de que é seguro investir no país porque, segundo ele, há garantia de que não haverá outro apagão.

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