quarta-feira, 24 de março de 2010

O ‘bumba meu boi’ das eleições

Empresário concede entrevista que promete ser o primeiro grande marco deste pleito, causando e gera medo e revolta em tucanos: declarações fortes e categóricas obrigam aos envolvidos no ‘fenômeno friboi’ se manifestarem o quanto antes

 


A entrevista era uma formalidade. Empresário de grande sucesso e uma referência mundial no segmento que atua, José Batista Junior resolveu entrar para o meio político. Terreno árido, onde nem mesmo o gado mais forte, se não for experiente e preparado para aquele chão específico, não prospera, Junior do Friboi, como é conhecido, tem se movimentado há alguns anos entre alguns partidos, feito contatos importantes com políticos e dirigentes e parece que, neste ano, vem com força e disposição para disputar uma vaga. Nem que seja na marra.
Dono de patrimônio incalculável para grande parte da população, o empresário nem mesmo tenta evitar a pecha de que está tentando “comprar” o mandato que escolher. E na mira está uma vaga no Senado ou a vice do PSDB, que tem como pré-candidato Marconi Perillo. Mas eis que no início da semana passada, Junior concede uma entrevista. E então, tudo o que parecia uma suspeita de problema, configurou-se em uma verdadeira tragédia para gregos e tucanos.
Conforme já mostrado em reportagem-análise na página 7 desta edição de O Anápolis, os desdobramentos das declarações de Friboi dentro do DEM não poderiam ser medidos de outra forma a não ser numa escala de hecatombe geral. A revolta de Ronaldo Caiado foi verbalizada por denúncias, xingamentos e promessas de interpelações judiciais.
Com isto, a primeira baixa em decorrência das falas desastradas de José Batista Junior já foi atestada. Porque, além de Ronaldo Caiado, presidente da legenda, o senador Demóstenes Torres ainda entrou na briga. Ele fez duras críticas ao empresário, evidenciando que o poderio econômico dele é o que está seduzindo partidos e quadros políticos a fim de permitirem a sua chegada ao processo eleitoral pela porta da frente e por cima, ou seja, já postulando espaço na senatória ou na chapa do executivo.


Mal no ninho
Mas não foi somente dentro do DEM, com os problemas envolvendo Caiado (veja reportagem na página 7) que a entrevista concedida na última segunda-feira a O Popular gerou incômodo. Até mesmo no PSDB de Marconi Perillo houve um início de preocupação com o incêndio que as declarações podem causar. Afinal, são afirmações categóricas que podem e deverão servir de armas contra os tucanos.
A principal delas é quanto aos acordos entre as partes sobre quem fica no poder e por quanto tempo. A tática do revezamento de mandatos, formando a tão combatida panelinha de 1998, ficou evidenciada pelo empresário que disse ter um acordo com Marconi Perillo para que ele deixe o governo em três anos e três meses de mandato para que ele assuma, vá à reeleição e, depois de 3 anos e três meses, passe o bastão para outro. Nem Nerso da Capitinga, o ingênuo matuto personagem-chave na eleição do Tempo Novo, acreditaria em tamanha inocência de um político em revelar as tramas intimas dos acordos feitos às escuras.
O espanto da repórter responsável pela entrevista é tanto diante da mostra do acerto, que ela insiste ao entrevistado: isto está planejado com Marconi Perillo? Ao que recebe como resposta: eu não entraria se não fosse dessa forma. A subida à superfície de tamanha sandice somente aponta que o caminho de Marconi Perillo e seus aliados está bem traçado, já garantindo a chegada ao poder a sua perpetuação, jogando pela janela a idéia da renovação, do fim das panelas. O que Junior do Friboi mostra é que o grupo marconista não é contra a “panela”, mas sim contra a posição em que se está em relação a ela: se dentro ou fora.


O empresário Junior do Friboi e sua especialidade, os bois: "huuuuuuuuuummmmm"

'Simplesmente' vice
O loteamento do governo também foi abordado por José Batista Junior. O empresário, acertando sua ida à vice, pretende ter pastas estratégicas do governo ligadas a ele somente. “Propus para o Marconi, eu indo para a vice, de criar uma secretaria de relações internacionais e desenvolvimento e que eu possa cuidar dessa parte. (Criar também) algumas secretarias ligadas a mim, alguma coisa bem mais ampla do que simplesmente ser vice”.
Junior ainda reduz ao cargo de segundo homem mais importante no comando do Estado a uma tarefa menor. “Não vou largar meus negócios, não faz sentido nenhum até porque não preciso disso para simplesmente ser vice”. E aponta mais caminhos já combinados “O que tenho combinado com o Marconi e com a base é que não viria para o debate político simplesmente como um vice, sem atuação nenhuma”.


IndecisãoOutra declaração de grande impacto dentro do ninho tucano foi quanto ao apoio a Dilma, uma vez que o seu PTB integra a base de Lula. Dentro da idéia do “nem sim, nem não, muito pelo contrário”, o empresário diz que pretende se manter ausente do debate político em âmbito nacional, mas jamais contra a candidata de Lula à Presidência.
Isto, em um momento de intensificação da polarização entre Serra e Dilma, chega aos ouvidos tucanos como uma ofensa. Como imaginar que um vice de Marconi Perillo pode ser incapaz de criticar ou mesmo de se posicionar em relação a Dilma e o seu embate com o candidato José Serra? A resposta, novamente clara e categórica, causa medo e desconforto nos tucanos e aliados marconistas.
“Quem é candidato a governador é ele [Marconi]. Eu disse para ele que espero que nós façamos uma campanha ética e de propostas. Agora, se ele quiser falar no palanque ou xingar alguém, o problema é dele, não vou compartilhar com isso. Não preciso ir lá. Quem me falou isso foi o presidente do partido, Jovair Arantes”.
Entre a cruz e a espada, no caso entre os ‘investimentos’ em campanha e a tolerância de um neófito dos mais temerosos ao lado, o que escolher?
A fatídica entrevista, que tem tudo para ser o primeiro marco desta campanha quando, no futuro for analisada criticamente, força aos envolvidos diretos ou não ao caso a se posicionarem. Aguarda-se a fala de Marconi Perillo para saber a veracidade do loteamento do governo que nem mesmo foi disputado, quando mais vencido, da intenção e do acerto fechado para a manutenção do poder através da troca de posições. E, ainda, aos tucanos históricos em se manifestar sobre como aceitar um vice que não consegue defender Serra e é incapaz de criticar Dilma.
Por fim, é preciso também ouvir o presidente do PTB no Estado, Jovair Arantes, para ter dele a confirmação de que acertou com o megaempresário este passe livre para que não precise se imiscuir em questões da política nacional.
Observando a entrevista em perspectiva, percebe-se um grande empresário tentando ter um status que ainda não tem: o de estrela da política. Sua intenção, a de usar o poderio financeiro para ‘adquirir’ um mandato não é nova e se mistura com a história da política. A novidade, neste caso, é vê-lo fazer isto com tamanho descaramento e desfaçatez, assumindo uma transparência perigosa e, por vezes, insana para o mundo já fraquejado da política.



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